O lúdico nas aulas de natação infantil: (…) afinal, de que lúdico estamos falando?

Prof. Dr. Leonardo Graffius Damasceno

 

O termo ou expressão “lúdico” parece estar encarnado no cotidiano dos professores(2) de natação infantil(3) na atualidade. Ele se faz presente na descrição dos Programas das escolas de natação, na conversa descomprometida entre os professores, nos chats on-line enfim e, em sua maioria, é caracterizado como um recurso facilitador do processo ensino-aprendizagem. Há inclusive quem, por ingenuidade acadêmica (quero crer!), o classificam como metodologia, ou seja, uma metodologia lúdica.

Ora, de que lúdico afinal estamos falando? A observação casual parece denunciar o caráter utilitarista consentido ao termo (l)lúdico, como detentor do significado contemporâneo atribuído à expressão boa aula, divertida, legal. Não que o lúdico e os aspectos que o qualificam, principalmente na faixa etária em discussão, sejam coisas ruins, longe disso! Mas o mau uso e/ou as contradições que dele emanam, estes sim, são ruins.

Refiro-me ao caráter utilitarista imputado ao lúdico no transcorrer dos anos o qual, geralmente em suas intervenções/aulas, o professor se vale para instrumentalizar jogos, brinquedos e brincadeiras subordinando-o a fins instrucionais. Quer dizer o jogo, o brinquedo e brincadeira utilizado para ensinar conteúdos da natação ou, apenas, uma atividade divertida na água para distrair
e recrear.

Se essa concepção utilitarista sobre o lúdico é tida como uma prática pedagógica da escola de natação e/ou utilizada como um recurso prático-didático pelo professor para facilitar o processo de aprendizagem, é preciso rever este paradigma pois ele carece de sustentação já que no cotidiano aquático infantil, é possível testemunhar inúmeras deformações ao lúdico, como por exemplo:“ pare de brincar e preste atenção senão você não aprende”; “se continuar a brincar você vai ficar sentado na borda pensando (de castigo!)”; “você veio aqui para aprender e, não, para brincar”. “se fizer tudo certinho, no final da aula eu deixo brincar”.

O lúdico admitido apenas pelo prisma utilitarista, transparece servir ao professor  como uma camuflagem pedagógica para afugentar o estigma que pode ser-lhe Imputado como um professor conservador, mecanicista, adepto de uma pedagogia empirista na qual o aluno é considerado uma “tábula rasa”. Ao contrário, valer-se do lúdico é ser contemporâneo ou quem sabe pós-moderno, e adepto de uma pedagogia que se vale de métodos ativos na qual o aluno é o protagonista do processo. Este paradoxo vivido pelo professor foi caracterizado por Cecília Meireles em 1964, em seu no poema Ou isto ou aquilo: “não sei se brinco, não sei se estudo […] se saio correndo ou fico tranquilo […] mas não consegui entender ainda qual é melhor […] não sei se isso ou aquilo”.

A contradição entre o brincar como algo espontâneo, criativo, prazeroso e que contextualiza o lúdico em detrimento ao aprender, como algo sério e produtivo é ainda reforçada pela aderência de alguns pais e/ou familiares que, ao presenciarem uma aula dinamizada por atividades contextualizadas como lúdicas, discordam da função concebida a uma escola de natação em face da opção docente para gerir aquela aula, balizada por jogos, brinquedos e brincadeiras.

Cria-se um impasse entre o pai que paga e quer ver resultados e a escola de Cecília Meireles – representada pela de natação infantil aqui referenciada, como o lugar de aprender, o que exige responsabilidade e seriedade e, não, um lugar para brincar (um lugar lúdico!), visto ser esta uma atividade improdutiva, face à soberania do conhecimento racionalista. Ratifica-se dessa forma o paradoxo levantado ou […] “não sei se isso ou aquilo”?

(… continua na próxima edição)

 

 

1 Professor Associado do Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo (CEFD-UFES). Doutor em Psicologia do Desenvolvimento.

2 O termo não faz referência a uma opção por gênero. Caracteriza, portanto, professores ep rofessoras

3 Infantil/infância em todo o texto, refere-se a faixa etária compreendida entre 0 a 6 anos de idade

 

Prof. Dr. Leonardo Graffius Damasceno

32 anos atuando no ensino superior – graduação e pós graduação e, desde 1980 atuando na área aquática.

Licenciatura Plena em Educação Física/Pós Graduação em Educação e Reeducação Psicomotora/Pós-Graduação em Estimulação Essencial ao Desenvolvimento/Pós-Graduação em Educação/ Mestrado em Educação Especial/Doutorado em Psicologia do Desenvolvimento/Autor de livros e artigos envolvendo as seguintes temáticas: Natação para Bebês e Infantil; Educação Fisica Pré-Escolar e Escolar/Jogos e Recreação/Psicomotricidade e Desenvolvimento/Natação Síndrome de Down e TDAH/Aprendizagem da natação e desenvolvimento cognitivo entre outras temáticas. Pesquisa a interrelação da aprendizagem da natação com o desenvolvimento cognitivo e motor de crianças tipicas e atípicas (neurodesenvolimento) sustentado na epistemologia genética de Jean Piaget.

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